- Por Sarah Rainsford
- Correspondente da Europa Oriental
Ao longo dos anos, Yulia Navalnaya tem sido uma presença constante ao lado do marido. Ela frequentemente segura a mão dele em protestos políticos e audiências judiciais.
Em 2020, quando Alexei Navalny foi envenenado por um agente nervoso, foi Yulia quem permitiu que ele fosse levado para o exterior para tratamento que salvou vidas.
Agora ele morreu sozinho e longe dela, numa prisão no Ártico.
Ele culpa o presidente russo, Vladimir Putin, e apela aos russos para que o apoiem agora na luta contra ele.
A declaração em vídeo de Yulia Navalnaya publicada online na segunda-feira foi um passo deliberado e dramático para atrair a atenção política. Seu amor pelo marido é tão forte, sua dor ainda é intensa e o registro é doloroso de assistir em algumas partes.
Mas é muito estressante.
A viúva de Navalny se descreve dividida em duas e com o coração partido. Mas é a sua raiva que a leva a defender a causa do marido.
Ela diz que quer realizar a “bela Rússia do futuro” para que sua morte “impensável” não seja em vão.
Para alguns russos contrários a Putin, agora mais pessimistas, o discurso teria sido encorajador.
Até este momento, Yulia Navalnaya era reservada e distante. Mas o vídeo revela que ela é uma mulher de imensa força interior.
A sua perda – e o seu amor – dão-lhe uma autoridade moral clara e ela é envolvente.
Mulheres fortes
Também há precedentes de mulheres fortes que defendem homens ausentes.
Este foi especialmente o caso na vizinha Bielorrússia, onde o ditador Alexander Lukashenko subestimou Svetlana Tikanovskaya, permitindo-lhe inscrever-se na campanha presidencial de 2020, quando o seu marido, Sergei Tikanovsky, foi preso.
Esse sexismo quase custou a Lukashenko o seu mandato mais longo no poder. Ao anunciar uma vitória esmagadora, Tikanovskaya atraiu grandes multidões às ruas gritando sobre uma votação fraudulenta.
Ela foi forçada a fugir para o exterior após um aviso da KGB e agora atua como “presidente” no exílio.
Evgenia Kara-Murza é diretora global.
Quando o seu marido foi envenenado em Moscovo em 2015 e 2017, Evgenia lutou para ficar ao seu lado no hospital, protegendo-o “como um cão”.
Na altura, Vladimir Kara-Murza fez campanha para que os líderes ocidentais aumentassem as sanções ao povo de Putin.
Mais tarde, em 2022, foi preso e condenado por traição por denunciar crimes de guerra russos na Ucrânia.
Evgenia passa agora a maior parte do tempo a dar continuidade à campanha do marido por sanções – bem como pela sua liberdade – nas capitais ocidentais.
Yulia Navalnaya pode assumir um papel semelhante.
Já se dirigiu aos ministros dos Negócios Estrangeiros da UE, que emitiram uma declaração de “indignação” pela morte de Navalny. Declararam que a “responsabilidade final” cabia a Putin e prometeram “custos adicionais” ainda não especificados.
Mas é difícil ver forças de oposição líderes na Rússia.
Yulia Navalnaya está no exterior para começar. Era demasiado perigoso para ela regressar a Moscovo como activista, pois foi acusada de ter mandado Putin matar o seu marido.
Na Rússia, a organização política de Navalny é banida como “extremista”, a par do grupo Estado Islâmico e da Al-Qaeda.
Em abril de 2021, o grupo de Navalny convocou um protesto, que declarou a “batalha final” antes da proibição da organização. O motivo foi forte. Houve forte presença policial.
Mas o número de manifestantes foi pequeno. Desde então, a pressão sobre todos os protestos intensificou-se.
Os apoiantes de Navalny estão na prisão ou no exílio para evitar a prisão.
Vladimir Putin passou as últimas duas décadas a esmagar sistematicamente toda a oposição ao poder.
Navalnaya não tem muito o que liderar.
Um monumento sem esperança
As flores empilhadas nos memoriais de Navalny em toda a Rússia mostram que muitas pessoas querem mudanças.
Cada vez que as homenagens são retiradas por homens de capuz preto, as pessoas trazem mais flores. É um ato de protesto silencioso e pacífico.
Estes russos são a viúva de Navalny, com o seu vídeo reunindo as pessoas e apelando a um “soco forte” no regime de Putin.
Mas o seu medo e sentimento de impotência são sentidos com muita força.
Afinal, foi Alexei Navalny quem mais bateu na sua vida e pelo qual pagou um preço elevado.